Desde 2019, houve um aumento significativo da extração de ouro na região Amazônia. Uma boa parte é ilegal. Combater a ação é cada vez mais difícil diante de um governo omisso. Veja mais neste artigo.

Aos poucos, o mundo acompanha a morte lenta e dolorosa da maior floresta tropical do planeta. Há anos, a Amazônia sofre com desmatamentos ilegais, queimadas, violência contra a comunidade indígena, avanço da agropecuária ilegal e mineração. Nos últimos dois anos, as explorações ilegais vêm crescendo, enquanto fiscalizações e ações de combate diminuem vertiginosamente.

A destruição do bioma gera bilhões aos cofres de empresas que burlam a legislação com o consentimento de órgãos públicos, prefeituras e governos, que deveriam ser os primeiros a se preocuparem com a preservação.

Entre os exploradores ilegais estão mineradoras. Elas retiram do solo bilhões em ouro e em pedras preciosas de maneira ilegal, burlando leis federais que normatizam a mineração na região.

A empresa Gana Gold Mineração é uma das que chamam a atenção por sua ação extremamente nociva ao meio ambiente. A mineradora extrai um volume de ouro 32 vezes maior do que o permitido, operando com licenças irregulares.

Um crime sem precedentes contra o meio ambiente e com a população que vive no local, que sente os efeitos diretos da devastação. Sente também o mundo, que já sofre com as consequências do aquecimento global.

Empresa investigada pela Polícia Federal

Líder na exploração de ouro na região Norte, a Gana Gold Mineração atua em uma área de conservação federal próxima à Terra Indígena Munduruku, em Itaituba, no estado do Pará.

Para se ter uma ideia, a empresa representa 18% da lavra do metal no estado paraense. De acordo com dados da Agência Nacional de Mineração (ANM), órgão federal que regula o setor minerador, a previsão era de que a mineradora tivesse uma operação anual prevista de 96,53 kg de ouro. Portanto, a sua receita anual deveria ser de R$ 30 milhões e não de R$ 1,1 bilhão, como foi declarado ao órgão regulador.

O salto de R$ 30 mi para R$ 1 bi se deu em menos de um ano. Para ser mais preciso, em apenas 8 meses. Nenhuma empresa consegue ter ganhos 32 vezes maior do que o estimado em tão pouco tempo. Não é uma produtividade considerada comum e, por isso mesmo, chamou a atenção da Polícia Federal, que investiga a movimentação empresarial da mineradora.

A investigação quer entender como a empresa tornou-se tão rentável com a extração que é permitida pela legislação. Além disso, investimentos vizinhos não conseguem, nem de longe, alcançar o mesmo efeito da Gana Gold, o que significa que há algo muito errado nessa história.

Segundo reportagem do site The Intercept Brasil, a mina recebeu autorização de funcionamento da prefeitura de Itaituba, que ignorou as legislações do governo do Pará e federal. Ou seja, a licença de operação é totalmente irregular. Ainda de acordo com o Intercept, a agência reguladora ANM nada fez para reverter a situação, deixando a empresa à vontade para minerar como bem entendesse.

A região de atuação da empresa passa por uma corrida do ouro, desde que o presidente assumiu o governo federal em 2019. As minas aproveitam o momento por saberem que o presidente e os seus ministros apoiam abertamente a atividade de garimpo. O governo tem até um projeto cuja a finalidade é liberar a mineração dentro de terras indígenas.

Imagem de garimpo ilegal em Roraima
Imagem de BBC

Exploração clandestina gera bilhões por ano

Anualmente, a mineração clandestina movimenta bilhões no Brasil. Só para se ter uma ideia da força da ilegalidade, entre 2019 e 2020, mais de um quarto das 174 toneladas de ouro foram de origem ilegal. A extração ilegal gerou um prejuízo de mais de R$ 9,8 bilhões para o país. Isso é o que diz o estudo realizado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e procuradores da República do Ministério Público Federal (MPF).

Por meio da pesquisa, foram abertas quatro ações civis públicas do MPF no Pará, que pedem a suspensão de garimpos na região. Além disso, os procuradores exigem o afastamento de instituições financeiras, acusadas de comprar ouro ilegal. Outra exigência é aumentar o controle sobre a comercialização do minério na região, assim como a sua extração.

Segundo a pesquisa da UFMG, a produção de ouro considerada ilícita continua alta em 2021. Das 46,8 toneladas do metal produzidas este ano, 26% são de extrações ilegais.  Os municípios do Pará que mais concentram o comércio clandestino de ouro são: Jacareacanga, Itaituba e Novo Progresso. Juntos, concentram 85,7% da venda ilegal. Muito desse metal é originário de áreas intocadas, como matas nativas.

Ilegalidade

A Gana Gold Mineração é uma empresa de grande porte e faz uso de maquinário pesado para extrair o ouro. Ela também conta com fábrica de beneficiamento do minério e uma pista de pouso de 850 metros de extensão. Segundo as denúncias do MPF, a pista foi construída em uma área desmatada ilegalmente.

Uma empresa do porte da Gana não deveria atuar na extração de ouro apenas com a licença concedida pela prefeitura. De acordo com as normativas da Agência Nacional de Mineração (ANM), para poder extrair o minério são necessários fazer o seguinte passo a passo:

  • Estudo de impacto ambiental;
  • Depois apresentar o documento ao Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade (ICMBio), órgão federal que regula áreas de preservação;
  • Após essa etapa, o instituto analisa os impactos ambientais da atividade pretendida até chegar à conclusão de que deve ou não conceder uma autorização de licenciamento ambiental (ALA);
  • Com a autorização do Instituto Chico Mendes, a empresa pode retirar a licença ambiental ou documento equivalente.

Porém, nada disso foi feito.  Na verdade, a ANM, que deveria cuidar da Amazônia, aceitou a licença que a prefeitura concedeu à empresa, permitindo a operação. A agência reguladora atropelou a própria legislação, sendo permissiva com a destruição em massa da floresta.